Feminicídio em Mato Grosso: audiência pública na ALMT expõe urgência de políticas de prevenção e proteção

Estado lidera índice nacional de feminicídios pelo segundo ano consecutivo; autoridades e sociedade civil apontam necessidade de ampliar atendimento no interior, garantir acesso a serviços e investir em prevenção

Fonte: CenarioMT

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Foto: Helder Faria

Mato Grosso voltou a ser destaque negativo no cenário nacional ao registrar, pelo segundo ano consecutivo, a maior taxa proporcional de feminicídios do país. Os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgados em julho, mostram que em 2024 foram 47 mulheres assassinadas por motivação de gênero, uma taxa de 2,5 casos por 100 mil habitantes. Em 2025, apenas até o mês de setembro, já são 37 vítimas contabilizadas.

Diante desse cenário, a Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) promoveu nesta quinta-feira (11) uma audiência pública para debater o enfrentamento à violência contra a mulher. A reunião, proposta pela deputada em exercício Edna Sampaio (PT), reuniu representantes do Executivo, Judiciário, Ministério Público, Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), conselhos estaduais e organizações da sociedade civil.

Para Edna, os números revelam a gravidade da situação. “Esses dados mostram que fracassamos retumbantemente na proteção da vida das mulheres. Cada feminicídio é acompanhado de milhares de outras violências invisíveis, que continuam a destruir famílias e comunidades. Precisamos de ações efetivas e urgentes”, afirmou.

A delegada Judá Marcondes, titular da Delegacia da Mulher em Cuiabá, destacou as disparidades entre a capital e o interior. Segundo ela, enquanto a rede de enfrentamento em Cuiabá já integra Polícia Civil, Patrulha Maria da Penha, Judiciário e Ministério Público, os municípios menores ainda carecem de estruturas mínimas. “É necessário garantir casas de amparo, atendimento psicológico, cursos e oportunidades de emprego no interior. Só assim vamos chegar até as mulheres mais vulneráveis, muitas vezes invisíveis em bairros distantes”, alertou.

A desigualdade também foi reforçada por Isabel Garcia, presidente do Movimento Negro Unificado em Mato Grosso. Para ela, mulheres negras e quilombolas enfrentam ainda mais obstáculos. “O tempo até que uma vítima consiga denunciar ou receber atendimento é precioso, e muitas vezes não chega a tempo. O poder público precisa estar mais conectado a essas mulheres”, defendeu.

Os números sobre medidas protetivas foram apresentados pela promotora Claire Vogel Dutra, coordenadora do Núcleo de Enfrentamento à Violência Doméstica da Capital. Em 2025, mais de 12 mil medidas já foram deferidas, mas apenas cinco das vítimas de feminicídio possuíam esse recurso. “As medidas protetivas salvam vidas, mas é preciso investir também em prevenção e em políticas sociais. Muitas mulheres ficam presas ao ciclo de violência por falta de alternativas, e a saúde mental é um ponto crítico”, observou.

A representante do Ministério das Mulheres, Terlúcia Silva, reforçou o papel da prevenção. “O pacto nacional de enfrentamento aos feminicídios já prevê ações de proteção e punição, mas precisamos expandir a prevenção. É nessa frente que o ciclo da violência pode ser interrompido antes do desfecho mais trágico”, avaliou.

Como encaminhamentos, a deputada Edna Sampaio anunciou que as propostas apresentadas serão levadas ao governo estadual e ao Ministério das Mulheres. Entre elas estão a criação de uma Secretaria Estadual de Mulheres, a ampliação de creches e CAPS, a inclusão dos direitos humanos das mulheres no currículo escolar e o fortalecimento da Patrulha Maria da Penha. Também foi defendida a instalação de casas de acolhimento, o funcionamento 24 horas das delegacias especializadas e a inclusão de mulheres trans e indígenas nas políticas públicas.

Novas audiências já estão agendadas para aprofundar o debate no interior: em Rondonópolis, no dia 15, e em Cáceres, no dia 18 de setembro.