O 18º Festival Latinidades foi palco de importantes reflexões sobre o trabalho digno e o papel das mulheres negras na sociedade brasileira. Realizado no Museu Nacional da República, em Brasília, o evento coincidiu com a publicação do decreto que regulamenta o Plano Nacional de Cuidados (PNC), estabelecendo diretrizes para redistribuir de forma mais justa as responsabilidades do trabalho de cuidados no país.
A fundadora do festival, Jaqueline Fernandes, ressaltou o foco do encontro: jovens negras e suas oportunidades no mercado de trabalho. Em parceria com o Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert), o evento promoveu o aprofundamento de debates sobre desigualdade, racismo e equidade de gênero.
Na abertura do encontro, a secretária nacional de Cuidados e Família do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social (MDS), Laís Abramo, apresentou dados que revelam que 75% do trabalho de cuidados no Brasil é realizado por mulheres, sendo 45% negras e 25% trabalhadoras domésticas. Abramo defendeu a divisão de responsabilidades entre gêneros, famílias, comunidades, empresas e o Estado.
O professor Breitner Luiz Tavares, da Universidade de Brasília, abordou a herança colonial que mantém mulheres negras vinculadas historicamente ao trabalho de cuidados, e reforçou a necessidade de políticas públicas construídas com participação ativa das próprias mulheres afetadas.
Luanda Mayra, coordenadora de Juventudes Negras do Ceert, destacou que o reconhecimento do cuidado como trabalho é essencial para sua valorização e remuneração justa. Para ela, transformar essa realidade exige colocar as juventudes no centro das decisões políticas.
Gisele Santos, da Rede de Ativistas do Fundo Malala, afirmou que o cuidado imposto às mulheres negras é uma continuidade da lógica escravocrata e defendeu que a nova política de cuidados seja pautada pelas vivências dessas mulheres.
Cássia Caneco, do Instituto Pólis, compartilhou sua experiência pessoal para reforçar que a política de cuidados deve ser reparatória e estruturante, promovendo uma nova lógica social baseada na equidade.
Kellen Vieira, produtora do Latinidades, apresentou dados que mostram que 90% dos profissionais negros da economia criativa são autônomos e 97% já presenciaram episódios de racismo. Ela questionou se o mercado está preparado para acolher profissionais negras com ensino superior.
Já Ronaldo Crispim, do Ministério do Trabalho, afirmou que o setor privado ainda está distante da equidade. Mulheres negras recebem menos da metade do salário de homens brancos em cargos semelhantes, mesmo com políticas públicas e objetivos internacionais em curso.
Andreia Alves, da Ação Educativa, propôs repensar os modos de vida e adotar o conceito de “bem viver”. Ela defendeu a esperança ativa como ferramenta de transformação social, destacando a potência das jovens mulheres negras.
O Festival Latinidades segue até o dia 31 de julho com debates sobre temas como a Lei da Aprendizagem e os impactos das mudanças climáticas na dignidade do trabalho futuro para as juventudes negras.