Os estados brasileiros destinam quase 5 mil vezes mais recursos às polícias do que a políticas voltadas a ex-presidiários. Em 2024, foram desembolsados R$ 4.877 para as forças policiais, R$ 1.221 para o sistema penitenciário e apenas R$ 1 para iniciativas exclusivas de reintegração de egressos.
A pesquisa O Funil de Investimentos da Segurança Pública e do Sistema Prisional, elaborada pelo centro de pesquisa Justa, analisou dados de 24 unidades federativas, que juntas representam 96% dos orçamentos estaduais. Piauí, Maranhão e Roraima não disponibilizaram informações, apesar das exigências legais de transparência.
De acordo com Luciana Zaffalon, diretora-executiva do Justa, os dados expõem o desequilíbrio orçamentário e a falta de políticas de reinserção social. “À porta de saída do sistema prisional, o cenário é de completo abandono e falta de recursos”, afirmou.
O levantamento mostra que, em 2024, os estados destinaram R$ 109 bilhões à segurança pública e ao sistema prisional. Desse total, 79,9% (R$ 87,5 bilhões) foram para as polícias, 20% (R$ 21,9 bilhões) para o sistema penitenciário e apenas 0,001% (R$ 18 milhões) para políticas de egressos.
Apenas seis estados investiram em programas específicos para pessoas que cumpriram pena: Bahia, Ceará, Mato Grosso, São Paulo, Sergipe e Tocantins. Para o Justa, essa desigualdade orçamentária alimenta a superlotação das prisões e impede o avanço de políticas de ressocialização.
O relatório destaca que o Plano Pena Justa, elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em parceria com o governo federal e a sociedade civil, é uma ferramenta essencial para equilibrar os investimentos. O plano busca reduzir a superlotação, melhorar a infraestrutura e garantir direitos às pessoas que deixam o sistema prisional.
Desigualdade também entre as polícias
Dentro das próprias corporações, a distribuição de recursos também é desigual. As Polícias Militares concentraram 59,7% dos valores (R$ 52,2 bilhões), enquanto as Polícias Civis receberam 23% (R$ 20,2 bilhões). As polícias técnico-científicas, responsáveis por perícias e provas técnicas, ficaram com apenas 3% (R$ 2,5 bilhões).
Segundo Zaffalon, a falta de investimento em investigação e produção de provas fragiliza a legitimidade do sistema penal. “Há um vício na porta de entrada, com prisões em massa sem base probatória sólida”, destacou.
Rio e São Paulo lideram os gastos
O Rio de Janeiro figura entre os estados que mais investem proporcionalmente em polícias, com R$ 10,3 bilhões, o equivalente a 10,3% do orçamento estadual. O estudo ressalta que o estado não destinou recursos à polícia técnico-científica e concentrou quase 80% dos gastos na Polícia Militar.
Em São Paulo, o gasto total com polícias atingiu R$ 16,9 bilhões, representando 4,9% do orçamento estadual. De acordo com o Justa, esse montante supera os investimentos combinados em 13 áreas públicas, como habitação, cultura e assistência social.
Organizações da sociedade civil denunciaram o aumento da violência policial em São Paulo à Organização dos Estados Americanos (OEA), apontando operações como Escudo e Verão, que resultaram em diversas mortes. O documento pede à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) recomendações ao Estado brasileiro para conter a letalidade policial.















