Carlos Bolsonaro tem sigilos fiscal e bancário quebrados pela Justiça em apuração sobre funcionários ‘fantasmas’ na Câmara do Rio

Fonte: GloboNews

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Foto: Reprodução/GloboNews

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro determinou a quebra dos sigilos bancário e fiscal do vereador do Rio Carlos Bolsonaro (Republicanos) na investigação que apura a contratação de funcionários “fantasmas” no gabinete do parlamentar.

Outras 26 pessoas e sete empresas também tiveram os sigilos quebrados.

Pela primeira vez desde o início da investigação, há dois anos, o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) levanta a possibilidade de um esquema de “rachadinha” no gabinete de Carlos na Câmara de Vereadores.

O pedido foi feito pelo MP à Justiça do Rio. A decisão da 1ª Vara Especializada de Combate ao Crime Organizado do Tribunal de Justiça do Rio foi dada em 24 de maio.

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Eleito vereador do Rio pela primeira vez em 2001, Carlos Bolsonaro está no sexto mandato consecutivo. Nesses 20 anos, dezenas de pessoas já foram nomeadas em seu gabinete.

O regulamento da Câmara do Rio diz que esses assessores têm que cumprir uma jornada de trabalho de 40 horas semanais.

Mas o MP afirma ter indícios de que vários desses assessores não cumpriam o expediente na casa. E podem ser considerados funcionários “fantasmas”.

Possibilidade de ‘rachadinha’

 

A investigação foi aberta em julho de 2019. E agora, pela primeira vez, os promotores falam na possibilidade da prática de “rachadinha” no gabinete de Carlos Bolsonaro.

O MP pediu a quebra dos sigilos para saber se a contratação desses funcionários fantasmas foi ou não um instrumento utilizado pelo vereador para desviar salários.

Promotores lembram Flávio Bolsonaro

 

Investigar o esquema não é novidade para o MP. No documento obtido pela GloboNews, os investigadores relembram que o modus operandi da “rachadinha” também foi detectado no gabinete do então deputado estadual do RJ Flávio Bolsonaro (irmão de Carlos Bolsonaro).

A prática, segundo os promotores, está associada a saques de dinheiro em espécie das contas dos assessores “fantasmas”, e que são entregues a funcionários de confiança do gabinete responsáveis pela arrecadação.

O dinheiro vivo é, então, usado para pagar despesas ou adquirir bens para o parlamentar.

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‘Grandes quantias de dinheiro’

 

O MP identificou que Carlos Bolsonaro manteve e utilizou grandes quantias de dinheiro vivo ao longo dos mandatos como vereador no Rio. E destacou pelo menos três episódios registrados que ilustram essas práticas.

Em 2003, Carlos pagou R$ 150 mil em espécie na compra de um apartamento na Tijuca, na Zona Norte do Rio. Em 2009, o vereador entregou R$ 15,5 mil, também em espécie, pra cobrir um prejuízo que teve na bolsa de valores.

E, no ano passado, durante a candidatura para reeleição ao cargo de vereador, Carlos declarou ao Tribunal Superior Eleitoral ter R$ 20 mil em espécie guardados em casa.

No pedido da quebra de sigilo, os investigadores também revelam a existência de um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras, o Coaf, que aponta duas operações financeiras suspeitas envolvendo Carlos.

Uma delas no valor de R$ 1,7 milhão, feita por Rogéria Nantes Bolsonaro, mãe do vereador, entre os anos de 2007 e 2019. O vereador foi citado na comunicação do Coaf por ser sócio de uma empresa junto com a mãe.

Seis núcleos

 

Os assessores do gabinete suspeitos de serem funcionários “fantasmas” foram divididos pelo MP em seis núcleos.Um deles é formado por parentes de Ana Cristina Siqueira Valle – ex-mulher de Jair Bolsonaro (sem partido), mãe do quarto filho do presidente da República, Jair Renan.

Ana Cristina foi chefe de gabinete de Carlos entre 2001 e abril de 2008 – ano em que se divorciou de Jair Bolsonaro. Desde junho, Ana Cristina e Jair Renan moram em uma mansão avaliada em R$ 3,2 milhões no Lago Sul, área nobre de Brasília.

O aluguel de casas vizinhas à da ex-mulher do presidente da República e de Jair Renan é de cerca de R$ 15 mil por mês. Ana Cristina pagaria R$ 8 mil, mais do que o salário de R$ 6,2 mil que recebe como assessora da deputada federal Celina Leão, do Progressistas.

Ana Cristina também foi alvo de comunicações do Coaf. O documento revela que, durante o período em que esteve à frente do gabinete de Carlos Bolsonaro, ela recebeu “depósito de elevadas quantias de dinheiro em espécie em sua conta bancária”.

Como, por exemplo, um depósito de mais de R$ 191 mil em março de 2011. E outro de mais de R$ 341 mil em julho do mesmo ano. O pedido de quebra de sigilo destaca ainda que Ana Cristina tinha um saldo de R$ 602 mil, que – segundo o Coaf – seria incompatível com a renda dela.

Indícios de ‘lavagem de dinheiro’

 

A movimentação acima da capacidade financeira cadastrada, além de transferências atípicas, segundo o documento, podem configurar indícios do crime de lavagem de dinheiro em conta de Ana Cristina.

Consta também o repasse de R$ 30 mil que Ana Cristina recebeu de uma tia, na época em que a parente ocupava cargo comissionado no gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa. Para o MP, essa é uma prática sugestiva de “rachadinha”.

Os investigadores dizem que a elevada movimentação em espécie sugere que Ana Cristina Siqueira Valle seja a destinatária dos salários pagos a parentes dela, que foram indicados para trabalhar no gabinete de Carlos Bolsonaro.

Esses parentes, aponta o MP, sequer moravam ou trabalhavam na cidade onde Carlos Bolsonaro tem cargo.

Os promotores afirmam que só depois da quebra dos sigilos será possível quantificar, com precisão, o volume de recursos desviados dos cofres públicos – pelos crimes de peculato, materializados no esquema das “rachadinhas” – e seguir o destino do dinheiro público desviado.

O que dizem os citados

 

Carlos Bolsonaro

Em nota, a defesa do vereador Carlos Bolsonaro afirmou que “a aquisição do imóvel localizado na Tijuca já foi objeto de análise pelo MP no ic 3191 e foi arquivado em 2005, após análise das informações financeiras que demonstravam a compatibilidade com os rendimentos à época“.

Também diz o texto que “a quantia utilizada em 2009, para pagamento de uma despesa pessoal, é absolutamente compatível com os rendimentos do vereador, assim como os valores devidamente declarados a Justiça Eleitoral no ano de 2020”.

A nota afirma que “com relação ao relatório do Coaf, a defesa não teve acesso a tais informações para verificar o seu conteúdo. No entanto, o vereador permanece à disposição para prestar qualquer tipo de esclarecimento as autoridades”.

Flávio Bolsonaro

Também por nota, a defesa do senador Flávio Bolsonaro afirmou que “está impedida de comentar detalhes porque o caso está em segredo de Justiça e todas as informações pertinentes foram e serão prestadas nos autos”.

E acrescentou que “o senador Flávio Bolsonaro desconhece supostas irregularidades que possam ter sido praticadas por ex- servidores da Alerj. O parlamentar sempre seguiu as regras da Assembleia Legislativa e tem sido vítima de uma campanha de difamação”.