Uma colaboração científica internacional, com participação da Embrapa, sequenciou os genomas de 450 genótipos de capim-elefante coletados em 18 países. O estudo revelou mais de 170 milhões de variações no DNA da planta e mapeou genes ligados à produtividade, valor nutritivo e potencial energético. A descoberta favorece o melhoramento genético da forrageira, que possui grande importância para a pecuária tropical e para a produção de bioenergia.
O trabalho foi publicado na revista científica G3: Genes|Genomes|Genetics e contou com nove instituições de pesquisa, lideradas pelo International Livestock Research Institute (ILRI), centro internacional de pesquisas mantido pelo CGIAR no Quênia. Do Brasil, três pesquisadores da Embrapa Gado de Leite (MG) integraram o grupo, reforçando o protagonismo do País em biotecnologia agrícola.
O projeto de sequenciamento começou em 2020 com a definição das populações que seriam avaliadas. Para desvendar a estrutura populacional e identificar genes-chave da planta, os pesquisadores contaram com bancos de germoplasma de cinco instituições de três continentes: ILRI, Embrapa, USDA, Lanzhou University (China), e Kenya Agricultural and Livestock Research Organization.
Descobertas devem acelerar o melhoramento genético do capim-elefante
Segundo o pesquisador da Embrapa Jorge Fernando Pereira, o sequenciamento identificou mais de 170 milhões de variações no DNA, proporcionando uma visão sem precedentes sobre a diversidade genética da espécie. A partir desses dados, os pesquisadores realizaram um estudo de associação genômica para localizar os chamados QTLs (Quantitative Trait Loci), que são regiões do DNA associadas a características agronômicas desejáveis.
Os resultados indicaram a presença de múltiplos QTLs significativamente ligados a características como produção de biomassa (rendimento da planta), teor de nitrogênio (valor nutritivo da forragem) e teor de celulose (fundamental para a produção de biocombustíveis e a para a digestibilidade da forragem). Segundo Pereira, essas descobertas são cruciais para o futuro do melhoramento de forrageiras tropicais. “Com a identificação desses genes, os programas de melhoramento genético poderão ser acelerados e direcionados, permitindo o desenvolvimento de novas variedades de capim-elefante que sejam mais produtivas, mais tolerantes à seca e que exijam menos fertilizantes, contribuindo para a produção mais eficiente e sustentável seja de forragem, seja de bioenergia”, afirma o cientista.
O pesquisador declara ainda que a participação da Embrapa nos estudos reforça a posição do Brasil na vanguarda da pesquisa em biotecnologia agrícola, com o conhecimento gerado sendo fundamental para o aprimoramento de forrageiras no contexto das mudanças climáticas.
Sequenciamento irá potencializar o capim-elefante
O capim-elefante, cientificamente conhecido como Cenchrus purpureus, é uma gramínea perene de grande porte, originária da África. Cultivado em regiões tropicais e subtropicais, é amplamente adotado pelos produtores brasileiros. Seu rápido crescimento e alta produtividade o tornou uma importante forrageira para a alimentação do gado. Na última década, a Embrapa desenvolveu duas cultivares da gramínea: a BRS Capiaçu, de porte alto, voltada para a produção de silagem e forragem no cocho e a BRS Kurumi, de porte baixo, mais adequada ao pastejo.
O capim-elefante também tem sido adotado como biomassa para produção de energia. Segundo o pesquisador da Embrapa Juarez Campolina Machado, a alta produção de biomassa da gramínea e o seu baixo custo justificam esse uso. Machado explica que o capim pode ser utilizado para a combustão direta em caldeiras, gerando calor e energia, ou transformado em biocombustíveis mais sofisticados, como o etanol celulósico (etanol de segunda geração).
Além disso, o capim-elefante é uma excelente matéria-prima para a produção de biogás e biometano, que podem ser usados para gerar eletricidade ou como combustível veicular. A gaseificação é outra tecnologia que permite converter a biomassa em um gás combustível sintético, e a pirólise permite a produção de bio-óleo, biocarvão e gás combustível por meio do aquecimento na ausência de oxigênio, ampliando ainda mais as possibilidades de uso dessa planta para fins energéticos.
A pesquisadora da Embrapa Ana Luisa Sousa Azevedo afirma que o sequenciamento genético irá potencializar o melhoramento do capim. “Esse estudo representa um avanço de conhecimento significativo, fornecendo informações importantes para identificação de marcadores moleculares específicos que são fundamentais para a aplicação de ferramentas genômicas na rotina dos programas de melhoramento genético da espécie”, diz a pesquisadora. O sequenciamento também fornece informações importantes sobre genes e suas variações em diferentes genótipos de capim-elefante. Essa informação será útil para experimentos de edição gênica.
Pereira diz que o sequenciamento possibilitará trabalhos com edição gênica nas cultivares já bem-sucedidas como a BRS Capiaçu e a BRS Kurumi além de poder ser utilizado para o desenvolvimento de novas cultivares. O conhecimento do genoma permite a utilização da edição gênica em genes associados a importantes características agronômicas e de qualidade. “Com esse conhecimento, o programa de melhoramento genético de capim-elefante da Embrapa pode obter, de forma mais precisa e rápida, materiais com genes editados que permitam maior produtividade, melhor qualidade e mais adaptados a estresses como a seca”, conclui o pesquisador.
Artigo científico
O estudo tem como título “Ressequenciamento de genoma completo de uma coleção global de capim-elefante (Cenchrus purpureus) para explorar a estrutura populacional global e QTLs que regem as características de produtividade e qualidade de forragem” (Whole-genome resequencing of a global collection of Napier grass (Cenchrus purpureus) to explore global population structure and QTL governing yield and feed quality traits). Veja a seguir o resumo do trabalho:
Objetivo: Explorar a estrutura populacional global do capim-elefante e identificar QTLs (loci de características quantitativas) que governam características importantes de produção e qualidade.
Metodologia: Foram sequenciados genomas de 450 genótipos de capim-elefante de 18 países. Os pesquisadores identificaram mais de 170 milhões de variações de DNA.
Resultados: O resequenciamento genético forneceu informações sobre a diversidade genética da espécie em escala global. Além disso, um estudo de associação em todo o genoma (GWAS) identificou múltiplos QTLs significativamente associados a características agronômicas importantes, como a produção de biomassa, e o teor de nitrogênio e celulose.
Implicações: As descobertas desse trabalho são um recurso importante para a conservação e compreensão da diversidade genética do capim-elefante em um contexto de mudanças climáticas. Elas também servirão de base para programas de melhoramento genético que visam desenvolver novas variedades com alto rendimento e tolerância à seca, tanto para forragem quanto para a produção de biocombustíveis.