O Ministério Público de Mato Grosso (MPMT) e o Ministério Público Federal (MPF) emitiram uma recomendação conjunta à Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) para que suspenda a autorização de novos empreendimentos hidrelétricos e a renovação de outorgas na Bacia Hidrográfica do Rio Teles Pires.
A medida é drástica e exige que a ANEEL se abstenha de agir até que seja realizada uma avaliação integrada e sinérgica dos impactos provocados pelas quatro usinas já instaladas em cascata.
A recomendação é resultado de inquéritos civis que investigaram os efeitos das Usinas Hidrelétricas Teles Pires, São Manoel, Colíder e Sinop. Os estudos confirmam que o licenciamento foi feito de forma fragmentada, sem uma análise que considerasse o efeito conjunto das usinas.
Graves impactos socioambientais e críticas à ANEEL
O Ministério Público criticou duramente a prioridade dada ao lucro em detrimento da sustentabilidade. O procurador de Justiça Gerson Barbosa afirmou que a ANEEL se preocupa “apenas com o potencial hidráulico do rio e com os lucros, em detrimento do princípio do desenvolvimento sustentável,” ignorando o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
A operação conjunta das quatro usinas gerou impactos cumulativos e sinérgicos de extrema gravidade, como:
- Morte em Massa de Peixes: Mortandade de aproximadamente 90 toneladas de peixes registrada entre 2014 e 2020.
- Danos à Ictiofauna: Inviabilização da reprodução de espécies migratórias.
- Saúde Comunitária: Degradação da qualidade da água, diretamente relacionada a problemas de saúde de comunidades indígenas a jusante (diarreias, vômitos e doenças dermatológicas).
- Danos Culturais: Destruição de locais sagrados para povos indígenas e agravamento da vulnerabilidade alimentar e cultural devido à ineficácia dos programas ambientais.
O documento aponta que a energia gerada no Rio Teles Pires é predominantemente transferida via Sistema Interligado Nacional, enquanto os custos e impactos ambientais permanecem localizados em Mato Grosso.
Exigência de revisão contratual e monitoramento integrado
Diante do cenário, o MPMT e o MPF exigem a revisão imediata dos contratos de concessão vigentes, com a inclusão de cláusulas ambientais específicas e exequíveis.
A recomendação exige que a ANEEL insira cláusulas que garantam:
- Monitoramento Único: Adoção de um monitoramento único, integrado e metodologicamente padronizado dos impactos.
- Protocolos de Operação: Implementação de protocolos que conciliem a geração de energia com a integridade socioambiental.
- Mitigação Proporcional: Adoção de medidas de mitigação e compensação proporcionais à magnitude dos danos constatados.
O Ministério Público também critica a ausência de consulta prévia, livre e informada às comunidades indígenas, em desrespeito à Convenção nº 169 da OIT.
A ANEEL tem 20 dias para responder à recomendação. Os membros do Ministério Público alertam que, após a notificação, a direção da Agência será considerada ciente da situação e passível de responsabilização por omissões futuras.