Tropicalização do lúpulo no Brasil aponta ganhos socioambientais e econômicos

Fonte: Assessoria

lupulo
Foto: HorgBio - Grupo de Pesquisa em Horticultura Orgânica e Biodiversidade

O cultivo de lúpulo no Brasil, regiões tradicionalmente consideradas inviáveis ​​em tropicais, está mostrando resultados promissores não apenas na produtividade, mas também nos aspectos socioambientais. Um estudo iniciado, conduzido em 10 fazendas de referência distribuídas entre Alagoas, Goiás e São Paulo, aplicou a ferramenta Ambitec-Agro para mensurar os impactos sociais, econômicos e ambientais da produção nacional. Os dados revelam que a tropicalização da planta — base indispensável da indústria cervejeira — pode contribuir de forma significativa para a sustentabilidade no campo.

De acordo com a avaliação, explica a doutoranda Viviany Viriato da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Botucatu, SP, os ganhos econômicos foram os mais valorizados, refletindo geração de renda, diversificação produtiva e valorização das propriedades.

“Também se destacaram avanços sociais, como formalização do trabalho, inclusão de mulheres e jovens e maior oferta de capacitações, além de efeitos ambientais positivos relacionados à recuperação de áreas degradadas e aumento da biodiversidade. Em comparação com usos anteriores da terra — como pastagens, soja, eucaliptos e cereais — o cultivo de lúpulo apresentou desempenho superior em diversos critérios”, disse a pesquisadora.

Sustentabilidade em três dimensões

A análise com a ferramenta Ambitec-Agro contém 27 critérios e 148 indicadores, que abrangem desde eficiência tecnológica e qualidade ambiental até emprego, renda e governança. O balanço geral mostrou 19 critérios positivos, seis negativos e dois sem alterações. Entre os pontos críticos, surgiu o aumento do consumo de energia elétrica, devido à necessidade de iluminação artificial, maior uso de insumos agrícolas e demanda elevada de água para irrigação. Já entre os destaques positivos estão a diversificação da renda, a regularização ambiental e a valorização de práticas sustentáveis, como uso de adubação verde, painéis solares e reciclagem de resíduos.

“A tropicalização do lúpulo no Brasil tem potencial de consolidar uma cadeia produtiva sustentável e de alto valor agregado, diminuindo a dependência de importações e abrindo espaço para a inovação na agricultura nacional”, apontam os autores do estudo.

Para mitigar impactos negativos, os agricultores adotaram soluções inovadoras. Algumas propriedades instalaram painéis solares para reduzir a pegada energética, além de implantar fertirrigação para otimizar o uso da água e dos insumos. Outras iniciativas incluíram o uso de seguros de equipamentos de proteção individual e treinamento dos trabalhadores, a adoção de adubação verde para promoção da fertilidade e sequestro de carbono e práticas de manejo integrado de diretivas.

Essas estratégias permitiram compensar parte dos impactos ambientais associados ao cultivo, ao mesmo tempo em que aumentaram a eficiência produtiva e reduziram os custos de médio prazo. A avaliação socioambiental, segundo os pesquisadores, também abre caminho para a identificação de oportunidades de melhoria contínua na cadeia do lúpulo.

No campo social, o estudo mostrou avanços importantes. O cultivo de lúpulo contribuiu para a formalização de contratos de trabalho, melhoria das condições ocupacionais e ampliação da participação feminina e juvenil. A pesquisa também destacou o fortalecimento do capital social, com maior envolvimento comunitário, realização de eventos voltados à colheita e desenvolvimento de atividades de educação ambiental.

Do ponto de vista econômico, os produtores observaram incremento no valor das propriedades e diversificação das fontes de renda. Embora os investimentos iniciais sejam altos e a rentabilidade ainda variada entre as fazendas, a expectativa é de crescimento expressivo no médio prazo, dada a valorização do lúpulo no mercado cervejeiro.

Contexto da produção brasileira

O Brasil é hoje o terceiro maior produtor de cerveja do mundo, mas ainda depende majoritariamente da importação de lúpulo. Em 2023, o país produziu cerca de 180 toneladas em 53 hectares cultivados, segundo dados da International Hop Growers Convention (HGC) , de 2023, frente a uma demanda que ultrapassa 15 bilhões de litros de cerveja por ano. Apenas uma fração — cerca de 41 milhões de litros — foi usada exclusivamente no lúpulo nacional, enquanto mais de 14 bilhões de litros dependiam disso, conforme dados do Mapa de 2024.

O número de produtores, entretanto, cresce rapidamente: já são 152 registrados no país, segundo dados do Mapa, 2022. Nos últimos cinco anos, o cultivo se expandiu sobretudo nas regiões Sul e Sudeste, com apoio da Associação Brasileira de Produtores de Lúpulo (Aprolúpulo) e de uma câmara técnica dedicada ao tema.

A pesquisa reforça que o cultivo do lúpulo é viável e estratégico para o país. Além de reduzir a dependência externa, fortalece pequenos e médios produtores, diversifica a agroindústria e abre perspectivas de exportação no futuro.

O papel da ciência na tropicalização

O lúpulo é uma trepadeira herbácea perene da família Cannabaceae , nativa de regiões de clima temperado e cultivada majoritariamente para a indústria cervejeira. Sensível ao fotoperíodo, exige condições climáticas específicas, geralmente entre os paralelos 45 e 50, sendo cultivada principalmente no hemisfério norte. No entanto, as pesquisas brasileiras têm mostrado que, com técnicas de manejo adequadas, é possível obter produtividade e qualidade competitivas em regiões tropicais.

Esse esforço científico é fundamental para consolidar a produção nacional e atender ao apetite da indústria cervejeira brasileira, que valoriza não apenas a qualidade sensorial da bebida — aroma, sabor e corpo — mas também o fortalecimento da identidade local por meio do uso de insumos cultivados no país.

O estudo conduzido com a ferramenta Ambitec-Agro reforça que a produção de lúpulo no Brasil não é apenas uma alternativa econômica, mas também um caminho para a sustentabilidade social e ambiental. Embora persistam desafios ligados a insumos, energia e água, os resultados positivos superam os negativos e indicam que a tropicalização do lúpulo pode ser um marco para a agricultura nacional.

Com o apoio da ciência e da inovação, o país se aproxima de reduzir sua dependência externa, ampliar oportunidades para agricultores e consolidar um novo capítulo na história da agroindústria cervejeira.

Ambitec-Agro

O Sistema de Avaliação de Impactos Ambientais de Inovações Tecnológicas Agropecuárias (Ambitec-Agro) consiste em um conjunto de matrizes multicritério que integra indicadores de desempenho de inovações tecnológicas e práticas de manejo implementadas na realização de atividades rurais.

Sete aspectos essenciais de avaliação são considerados: Eficiência tecnológica; Qualidade Ambiental; Respeito ao Consumidor; Emprego; Renda; Saúde; e Gestão e governança.

Os critérios e indicadores são construídos em matrizes de ponderação, nos quais dados obtidos em campo, junto ao produtor/administrador do estabelecimento, são automaticamente transformados em índices de impacto expressos graficamente.

Os autores do estudo são Viviany Viriato (Unesp); Geraldo Stachetti Rodrigues (Embrapa Meio Ambiente); Márcio Renato Nunes (Universidade da Flórida, EUA); Abebe Adege (Universidade da Flórida, EUA) e Filipe Bonfim (Unesp).

Formado em Jornalismo, possui sólida experiência em produção textual. Atualmente, dedica-se à redação do CenárioMT, onde é responsável por criar conteúdos sobre política, economia e esporte regional. Além disso, foca em temas relacionados ao setor agro, contribuindo com análises e reportagens que abordam a importância e os desafios desse segmento essencial para Mato Grosso. Cargo: Jornalista, DRT: 0001781-MT