Em Tiradentes, Minas Gerais, ruas de pedra, casarões e igrejas são conhecidos pontos turísticos, mas parte essencial da história, como a contribuição de pessoas escravizadas na construção e economia local, permanece apagada.
O tema foi discutido na mesa Quando a conta é o silêncio: cemitérios apagados, memórias insurgentes, realizada na sexta-feira (12), no Festival Artes Vertentes. Foram abordadas as experiências de ao menos 22 mil pessoas forçadas a trabalhar na região durante o século 18, quando a Vila de São José se destacou na exploração do ouro.
Segundo o antropólogo e educador Patrick Arley, há um apagamento dos saberes, filosofia e cosmologia das pessoas trazidas à força. Ele destacou que o patrimônio urbano reflete apenas a memória das famílias ricas e brancas, ignorando outras formas culturais e espirituais.
“A gente fala de cidade histórica, de patrimônio, mas o que é considerado patrimônio dentro desse discurso? Geralmente, apenas igrejas e casarões de famílias ricas. Outras formas de sagrado e saberes são ignoradas.”
Boaz Mavoungou, da Fundação Cultural Palmares, defendeu políticas públicas para equidade e combate ao racismo, enfatizando a preservação da memória como forma de justiça histórica.
“A equidade é quando a lei trata todos com respeito e ninguém está acima do outro por algum privilégio.”
O debate também criticou o turismo desrespeitoso em locais ligados à escravidão, comparando a situação a cenários de extrema violência histórica.
Políticas públicas e cultura
Outro destaque do festival foi a mesa Entre o Estado e a Rua: Políticas Públicas e Justiça Racial nas Margens do Atlântico, que abordou a importância de políticas culturais e de cotas para reduzir desigualdades. A deputada Andréia de Jesus ressaltou leis como Aldir Blanc e Paulo Gustavo para fomentar a cultura de comunidades tradicionais e manifestações negras, como hip hop e funk.
Mavoungou complementou que cultura reflete a memória e história de um povo, indo além de objetos materiais. Anne Louyot, comissária da Temporada França-Brasil 2025, defendeu a necessidade de diálogo internacional para enfrentar injustiças raciais e econômicas.
Festival Artes Vertentes
A 14ª edição do festival começou com cortejo e apresentações musicais e seguirá até o dia 21, em Tiradentes, São João del Rei e Bichinho, com destaque para cinema, memória e resistência. A maior parte das atividades é gratuita.