Ao completar mais de cinco décadas, o hip hop consolidou-se como uma das expressões culturais mais influentes do mundo, sem abrir mão de sua origem contestatória. O pesquisador e jornalista Spensy Pimentel destaca que o gênero se tornou dominante no mercado musical global, mas ainda mantém sua função de porta-voz das lutas sociais.
Segundo Pimentel, o rap segue sendo canal de resistência em diferentes contextos, incluindo a formação de grupos indígenas no Brasil, como o Brô Mc’s, criado em 2009 por jovens guarani-kaiowá em Mato Grosso do Sul. As letras abordam questões como violência, superlotação nas reservas, suicídio entre jovens e insegurança alimentar, refletindo realidades semelhantes às das periferias urbanas.
Relançamento do livro
O Livro Vermelho do Hip-Hop, originalmente produzido em 1997 como trabalho de conclusão de curso na USP, retorna em nova edição pelas editoras Glac e Autonomia Literária. A obra nasceu de entrevistas com expoentes do movimento em capitais como São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e Brasília, circulando inicialmente em cópias fotocopiadas e posteriormente em versão digital.
O lançamento mais recente, realizado na Festa Literária Pirata das Editoras Independentes (Flipei), em São Paulo, atualiza a análise da época e reforça a importância de preservar a memória do movimento. Pimentel ressalta que a proposta é conectar as novas gerações às raízes do hip hop, diretamente ligadas às lutas de descolonização e justiça social.
Referências históricas
A obra também resgata influências fundamentais, como a atuação dos Panteras Negras, organização norte-americana que enfrentava a violência policial contra a população negra. O título do livro faz referência ao Livro Vermelho de citações de Mao Tsé-Tung, utilizado pelo grupo para arrecadar fundos.
No mesmo contexto, o autor relembra figuras centrais como Martin Luther King e Malcolm X, além de produções audiovisuais que marcaram a formação da cultura hip hop. Pimentel aponta que o trabalho preencheu uma lacuna nos estudos acadêmicos da época e contribuiu para o reconhecimento do movimento como manifestação cultural legítima.
No Brasil, o rap vivia fase de expansão nos anos 1990, com marcos como o álbum Sobrevivendo no Inferno, dos Racionais MC’s, lançado em 1997. A relevância da obra foi reafirmada em 2020, quando suas letras se tornaram leitura obrigatória no vestibular da Unicamp. Desde então, a presença do hip hop nas universidades e no cenário cultural se intensificou, acompanhada por novos estudos e pesquisas.