Ficção resgata memória negra na história brasileira

Durante a Flip 2025, Conceição Evaristo e Ana Maria Gonçalves destacam como a literatura preenche lacunas deixadas pela história oficial.

Fonte: CenárioMT

Paraty (RJ), 31/07/2025 - A escritora Lilia Guerra participa da mesa A casa, o mundo durante a 23ª Festa Literária Internacional de Paraty - Flip no Auditório Matriz. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Ficção resgata memória negra na história brasileira - Foto: Agência Brasil

Conceição Evaristo defendeu o papel da literatura na preservação da memória negra no Brasil, durante participação na 23ª Festa Literária de Paraty (Flip). Ao lado da autora Lilia Guerra, ela afirmou que, diante da omissão da história oficial, a ficção se torna essencial para reconstruir narrativas sobre os africanos e seus descendentes no país.

“No espaço em que a história e a ciência deixaram de eleger fatos relativos à história dos africanos e seus descendentes no Brasil, a literatura entra com a sua ficção”, declarou Evaristo, citando o romance Um defeito de cor, de Ana Maria Gonçalves, como exemplo marcante dessa reconstrução.

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Para Evaristo, a memória herdada de gerações subalternizadas “arde” na formação da identidade negra brasileira. “Essa ardência nos coloca no campo da luta, da crença, da esperança e da ação”, destacou.

Em resposta a uma jovem da plateia, a autora lembrou o legado de resistência das mulheres negras, ressaltando que a dor do passado impulsiona a luta atual. “Todo o silenciamento que foi provocado, toda subalternidade que as nossas mais velhas passaram… tudo isso nos potencializa para estar aqui hoje.”

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Evaristo também evocou a tradição oral das mulheres negras escravizadas, que contavam histórias para os filhos da Casa Grande. “A nossa escrevivência não é para ninar os da Casa Grande, e sim para acordá-los dos seus sonos injustos.”

Ana Maria Gonçalves

Também homenageada na Flip, Ana Maria Gonçalves falou sobre o processo de criação do romance Um defeito de cor, recentemente reconhecido com sua eleição como a primeira mulher negra imortal da Academia Brasileira de Letras.

“A história negra do Brasil vai sendo reconstruída retroativamente, conforme vamos conseguindo, pela ficção ou por documentos, preencher lacunas que a história não dá conta”, disse. A autora revelou que documentos recentemente encontrados sobre Luiza Mahin, mãe de Luiz Gama, podem oferecer novas perspectivas sobre a personagem que inspirou sua obra.

Segundo Gonçalves, a protagonista Kehinde é fruto de uma extensa pesquisa sobre diversas mulheres negras da época. “A história dela é composta por pelo menos umas 300 outras mulheres”, afirmou, explicando que seu romance é uma “colcha de retalhos” baseada em fontes históricas como jornais, revistas e arquivos.

*A repórter e a fotógrafa viajaram a convite da Motiva, patrocinadora e parceira oficial de mobilidade da Flip 2025.

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Graduado em Jornalismo pelo Unasp (Centro Universitário Adventista de São Paulo): Base sólida em teoria e prática jornalística, com foco em ética, rigor e apuração aprofundada.