Antes de morrer de Covid-19, médica escreve carta relatando dificuldade para conseguir oxigênio; MP investiga o caso

Fonte: RPC Foz do Iguaçu

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Foto: Reprodução/RPC

Antes de morrer vítima da Covid-19, uma médica escreveu uma carta relatando dificuldades para ter acesso ao oxigênio disponibilizado pela Secretaria Municipal de Saúde de Salto do Lontra, no sudoeste do Paraná.

No documento, Thedra Saucha, de 35 anos, repudiou as ações do gestor da pasta na cidade, Valdecir Baldessar, e afirmou que o secretário impediu que equipes levassem oxigênio até a casa onde ela morava.

Segundo a esposa Ramonyele Martins, a médica estava cumprindo repouso domiciliar depois de receber alta do hospital e ter prescrição para uso do recurso pois estava com 70% do pulmão acometido pela doença.

Ainda conforme a companheira da vítima, tanto Thedra como outras pessoas afirmavam que a disponibilização de oxigênio diretamente na casa dos pacientes era praxe da Secretaria Municipal de Saúde.

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“A gente ligou para o pronto socorro dizendo que o oxigênio estava acabando. E aí a moça disse que o secretário não deixou, que ela que desse um jeito de buscar. Você abre o chão naquele momento, você está em um lugar que não é seu, você não sabe para quem ligar”, relembrou a esposa.

 

Diante da recusa, o casal precisou ir até uma unidade hospitalar buscar oxigênio. Thedra, que deveria ficar em repouso, foi quem dirigiu todo o caminho pois a esposa não tem carteira de habilitação.

“Chegando lá tinham três ambulâncias paradas, nenhuma ocorrência ou algo grave acontecendo. Pessoal saiu correndo ali para pegar o oxigênio para ela, e eles a todo momento pedindo desculpas que não eram eles que não queriam levar, que foram as ordens dadas”, contou.

No local, quatro pessoas ajudaram a colocar o cilindro no carro, de acordo com . Ao chegar em casa, ela precisou sozinha dar conta de levar o equipamento até o quarto.

“Pesou muito pra ela [Thedra]. Além dela ter que estar em repouso absoluto, teve que fazer um esforço gigante, levantar e sair. Como você se sente como ser humano? Parece que não tem valor nenhum”, desabafou.

Procurado, o secretário de saúde da cidade afirmou que a regra no município é que a reposição do oxigênio a domicílio seja feita apenas durante o período de isolamento do paciente.

“O município entrega oxigênio quando o paciente teve alta com requisição medica para tratamento e faz a troca na residência quando o paciente e a família estão em isolamento pela doença. Depois disso a gente fornece o oxigênio mas para buscarem a reposição gratuitamente”, alegou Valdecir Baldessar.

Apesar dos esforços, Thedra apresentou piora no quadro de saúde e precisou voltar para o hospital. No dia 14 de abril, a médica não resistiu e morreu vítima da doença.

Ministério Público investiga o caso

Ainda conforme a carta, Thedra afirmou que quando estava internada pela primeira vez por conta da doença recebeu um documento da secretaria de Saúde pedindo que ela indicasse um médico para a substituir na unidade de saúde.

O contrato entre a médica e a prefeitura era por meio de Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica.

Valdecir Baldessar confirmou o documento e disse que a medida era para suprir a ausência da médica e atender a alta demanda de pacientes na unidade.

“Naturalmente precisamos repôr o médico de volta na unidade de saúde até pelo que estamos vivendo. O município tem mais mil pessoas que passaram pela Covid, temos muito pós Covid que são atendidos na UBS e precisamos de médicos pela demanda grande de consulta. Ainda temos dificuldade onde ela trabalhava, por causa dos trâmites legais para contratar. Precisávamos apenas que ela indicasse outro médico para começar o trabalho enquanto ela estivesse internada”, afirmou.

Em posse da carta, o Ministério Público do Paraná (MP-PR) abriu uma investigação para apurar a conduta do secretário e também do município.

“Será iniciada uma investigação para que possamos apurar a conduta do secretário e do município frente ao atendimento da médica que, infelizmente, veio a falecer, e reunir assim todas as informações para a questão” disse o promotor Leandro Suriani Gobi.