A Justiça Eleitoral em Mato Grosso celebrou nesta terça-feira (11) seus 93 anos de instalação. O vice-presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MT) e corregedor Regional Eleitoral Marcos Machado deixou mensagem em que resgata a história, o pioneirismo, os desafios logísticos, o compromisso com a cidadania e o futuro da Justiça Eleitoral de Mato Grosso, com ênfase no combate à desinformação e o uso de novas tecnologias.
Leia abaixo, na íntegra, a mensagem do desembargador Marcos Machado.
“Mensagem do Vice-Presidente e Corregedor Regional Eleitoral em razão da comemoração dos 93 anos da Justiça Eleitoral de Mato Grosso.
É com grande honra que apresento estas singelas palavras em razão da comemoração dos 93 anos da Justiça Eleitoral de Mato Grosso.
Ao longo de quase um século de existência, nossa Justiça Eleitoral tem atuado de forma decisiva para garantir que a voz do povo mato-grossense seja ouvida e seus direitos respeitados.
A instalação da Justiça Eleitoral em Mato Grosso remonta a 11 de novembro de 1932, logo após a criação dos Tribunais Regionais Eleitorais pelo Decreto nº 21.076 daquele ano.
Já em maio de 1933, organizou-se a primeira eleição sob a égide deste novo sistema, elegendo os representantes para a Assembleia Nacional Constituinte. Iniciava-se assim uma trajetória histórica dedicada à consolidação da democracia e da cidadania em nosso Estado.
Essa jornada não esteve isenta de percalços. Em 1937, durante o Estado Novo, a Justiça Eleitoral foi abruptamente extinta pelo regime ditatorial então instaurado, que suspendeu as eleições livres e suprimiu os órgãos eleitorais.
Contudo, mesmo diante dessa interrupção autoritária, os valores democráticos não se apagaram. A Justiça Eleitoral foi recriada nacionalmente em 28 de maio de 1945 pelo Decreto-Lei nº 7.586 (Lei Agamenon). O Tribunal Superior Eleitoral foi instalado em 1º de junho de 1945 no Palácio Monroe, Rio de Janeiro. A Resolução-TSE nº 1 estabeleceu que todos os Tribunais Regionais deveriam estar instalados até 16 de junho de 1945.
Desse modo, a Justiça Eleitoral em Mato Grosso retomou sua missão de assegurar a soberania popular. Desde então, tem se empenhado em fortalecer a consciência cívica dos cidadãos e zelar pela integridade dos pleitos, contribuindo para o aprimoramento contínuo de nossas instituições eleitorais.
Ao longo de sua história, a Justiça Eleitoral mato-grossense mostrou vocação pioneira na busca de soluções inovadoras para tornar o processo de votação mais democrático, seguro, ágil e acessível.
Um marco de orgulho para nosso Estado é a participação de Mato Grosso na concepção da urna eletrônica brasileira.
Mato Grosso realizou testes com a “máquina de votar” em 1993-1994, incluindo uma simulação em 8 de abril de 1994 na Escola Ana Maria do Couto (Bairro CPA II, Cuiabá), com presença do Ministro Sepúlveda Pertence e de presidentes de diversos TREs. O servidor Luiz Roberto da Fonseca, secretário de TI do TRE-MT nos anos 90, foi responsável pelo protótipo mato-grossense.
Tal iniciativa visionária da Justiça Eleitoral de Mato Grosso contribuiu para o desenvolvimento do modelo nacional adotado posteriormente – o qual, em comissão avaliativa, foi apontado como um dos mais bem-sucedidos protótipos do país.
Graças a esforços como esse, a Justiça Eleitoral implantou gradualmente a urna eletrônica a partir de 1996, alcançando em 2000 a total informatização do voto, o que encerrou de vez a era das cédulas de papel.
Essa revolução tecnológica elevou os patamares de segurança e transparência do pleito, eliminando a intervenção humana na apuração e reduzindo drasticamente as fraudes e erros, além de assegurar o direito de voto a todos, inclusive aos cidadãos antes excluídos por barreiras do voto em papel, como pessoas com deficiência visual ou analfabetos. Hoje, o eleitor mato-grossense vota digitando números em um teclado similar ao de um telefone e confirmando seu voto com a foto do candidato na tela – um processo simples, rápido e acessível a milhões de brasileiros, que fez cair significativamente o número de votos brancos e nulos desde sua adoção. Essa inovação deu vida ao espírito da Constituição Cidadã de 1988, garantindo na prática o sufrágio universal, livre e soberano.
O compromisso com a modernização prosseguiu nas décadas seguintes. A partir de 2008, novos desafios foram enfrentados: a implantação do cadastramento biométrico dos eleitores – garantindo ainda mais segurança por meio da identificação digital – e o uso de tecnologia via satélite para transmitir rapidamente os resultados em pontos remotos do estado. Em Mato Grosso, tivemos início do cadastramento biométrico em 2010.
Os resultados desses esforços são visíveis: atualmente Mato Grosso conta com cerca de 2,54 milhões de eleitores, dos quais cerca de 91% estão biometricamente cadastrados, reforçando a confiabilidade e rapidez na identificação do eleitorado.
Administrar eleições em Mato Grosso equivale a vencer desafios logísticos dignos de um país de grande extensão. Nosso estado, com seus 903 mil quilômetros quadrados, é o terceiro maior do Brasil em território – pouco menor que a Venezuela – e abrange 142 municípios espalhados por vastas regiões de cerrado, pantanal e floresta amazônica. Garantir que cada cidadão, mesmo nos rincões mais afastados, possa exercer seu direito de voto exige planejamento, dedicação e criatividade por parte da Justiça Eleitoral.
Temos inúmeros exemplos inspiradores dessa missão. Recentemente, equipes da Justiça Eleitoral enfrentaram longas jornadas por estradas de terra e rios para levar atendimento a comunidades isoladas. Numa ação itinerante em outubro último, um servidor viajou mais de 300 km, dos quais 267 km por estrada de chão quase intransitável, e depois embarcou 45 minutos de barco pelo rio Juruena para chegar à Aldeia Matrinxã, do povo Apiaká, no extremo norte de Mato Grosso.
Tudo isso para garantir serviços eleitorais básicos – alistamento de novos eleitores, revisões, transferências de títulos e coleta de dados biométricos – a cerca de 30 cidadãos indígenas daquela comunidade. Essa dedicação exemplifica nosso compromisso em não deixar nenhum eleitor para trás, por menor ou mais distante que seja sua localidade.
Destaca-se também a participação dos povos originários nas eleições de Mato Grosso. Mato Grosso abriga diversas etnias indígenas (Boe-Bororo, Haliti-Paresí, Xavante, dentre outras), e a Justiça Eleitoral tem empreendido esforços para garantir plenamente sua participação no processo democrático.
Estruturas eleitorais vêm sendo levadas até terras indígenas e localidades remotas. Novas seções eleitorais foram instaladas em aldeias, facilitando o voto sem que os eleitores precisem percorrer grandes distâncias até as urnas. Em parceria com órgãos como a Funai e prefeituras, a Justiça Eleitoral tem promovido mutirões de cadastramento e voto consciente dentro das comunidades. Essa presença ativa reforça a mensagem de que a democracia brasileira pertence a todos os povos – e que, em Mato Grosso, do centro geodésico da América do Sul às fronteiras longínquas, cada voto importa na construção do bem comum.
Ao celebrarmos 93 anos de conquistas, renovamos nosso compromisso inabalável com a ética, a transparência e o fortalecimento das instituições democráticas, fundamentos que sempre nortearam a Justiça Eleitoral.
Nossa missão institucional é fortalecer a democracia em prol de uma sociedade fraterna, igualitária e plural, garantindo a legitimidade e a transparência do processo eleitoral.
Esses princípios não são meras palavras, mas valores vividos cotidianamente – da conduta dos servidores e magistrados à prestação de contas pública, do planejamento estratégico às iniciativas de integridade e compliance. A Justiça Eleitoral mato-grossense pauta todas as suas ações pela integridade e pela publicidade dos atos, ciente de que a confiança da sociedade se conquista com retidão e transparência. Cada decisão deve ser ética e cada gesto, íntegro, de modo a preservar o interesse público e a credibilidade da instituição frente ao cidadão.
Os desafios do futuro exigem de nós a mesma coragem e vanguarda demonstradas pelos nossos antecessores. A democracia brasileira, embora madura, demanda constante zelo e aperfeiçoamento. Será preciso seguir consolidando os institutos democráticos, o que inclui ampliar a educação política da população, combater a desinformação e o discurso de ódio, e aperfeiçoar mecanismos de participação popular. Temos o dever de aproximar ainda mais o eleitorado – especialmente os jovens e grupos historicamente marginalizados – do processo eleitoral, seja por meio de iniciativas de acessibilidade, seja pelo incentivo à participação consciente e informada. Somente assim fortaleceremos, a cada eleição, os alicerces de uma cidadania ativa e plena.
Paralelamente, viveremos uma era de transformações tecnológicas aceleradas, e a Justiça Eleitoral precisa estar preparada para utilizar novas ferramentas de forma responsável. A inteligência artificial (IA) desponta como exemplo emblemático: aplicada com critério, ela poderá otimizar procedimentos internos, dar mais celeridade à análise de dados e melhorar os serviços prestados ao cidadão.
Por outro lado, sabemos que as mesmas ferramentas podem ser deturpadas para ameaçar a lisura do pleito. A proliferação de fake news e conteúdo manipulativo – agora potencializada por recursos de IA generativa capazes de criar deepfakes – representa um desafio que já estamos enfrentando de frente. Recentemente, o TSE aprovou normas pioneiras no mundo para coibir o uso ilícito de inteligência artificial nas eleições. Está proibida, por exemplo, a veiculação de deepfakes que difundam fatos inverídicos sobre candidatos, configurando abuso passível de cassação. Além disso, tornou-se obrigatório sinalizar ao eleitor quando um conteúdo de campanha for produzido com auxílio de IA, garantindo transparência na informação.
Provedores de redes sociais também foram chamados à responsabilidade de remover prontamente materiais enganosos ou odientos, sob pena de sanções. Com essas medidas, a Justiça Eleitoral se aparelha de instrumentos eficazes para combater a desinformação e proteger a vontade popular contra distorções tecnológicas maliciosas.
Preparar-se para o futuro significa, assim, equilibrar inovação com responsabilidade. Vamos abraçar as novas tecnologias que possam aprimorar nosso trabalho – seja um sistema de inteligência artificial para apoiar análises, seja uma plataforma digital mais acessível ao eleitor – porém sempre com o olhar atento à segurança, à transparência e à equidade do processo eleitoral.
A Justiça Eleitoral de Mato Grosso, alinhada às diretrizes nacionais, continuará investindo na formação de seus quadros para o uso consciente dessas ferramentas, bem como no desenvolvimento de políticas que resguardem a lisura do pleito e a igualdade de oportunidades entre os participantes das eleições.
Nosso objetivo final permanece aquele delineado há 93 anos: afastar quaisquer interferências indevidas da vontade do eleitor, assegurando que cada voto depositado na urna – seja ela eletrônica, biométrica, ou quem sabe um dia auditada por algoritmos avançados – reflita livremente a escolha soberana de cada cidadã e cidadão.
Ao relembrarmos essa trajetória quase centenária, fica evidente que a Justiça Eleitoral de Mato Grosso muito contribuiu para a consolidação da democracia e da cidadania em nosso Estado e no Brasil. Dos primeiros passos em 1932 à vanguarda tecnológica do presente, passando pelos períodos de resistência e reconstrução, cada capítulo dessa história reforçou a convicção de que o poder emana do povo e de que cabe à Justiça Eleitoral fazer valer essa premissa constitucional em toda sua plenitude.
Celebrar 93 anos não é apenas exaltar o passado, mas principalmente reafirmar nosso compromisso com o futuro.
Reafirmamos, portanto, nosso compromisso inabalável com a ética na gestão pública, com a transparência absoluta de nossos atos e com o contínuo fortalecimento das instituições democráticas que sustentam a República.
Como Corregedor Regional Eleitoral, asseguro que continuaremos vigilantes na correção de rumos, no aprimoramento dos serviços eleitorais e na promoção da legalidade e da justiça em cada decisão.
Que esta data festiva sirva de inspiração para todos nós – magistradas e magistrados, servidoras e servidores, colaboradoras e colaboradores, cidadãs e cidadãos – renovarmos juntos a confiança na Justiça Eleitoral.
Empunhando os valores que nos trouxeram até aqui e abertos às inovações que o amanhã nos reserva, seguiremos trabalhando para que cada eleitor mato-grossense, de cada canto deste Estado imenso, exerça seu direito de voto de forma livre, consciente e segura.
Assim, honramos o legado destes 93 anos e pavimentamos o caminho para o centenário desta instituição, certos de que a democracia sairá sempre vencedora, fortalecida pela participação de todos e pela retidão de cada processo eleitoral.
Por fim, com profundo respeito, nossos agradecimentos aos que nos antecederam e aos que hoje mantêm esta instituição viva, eficiente e indispensável.
Desembargador MARCOS MACHADO
Vice-presidente do TRE-MT e Corregedor Regional Eleitoral”


















