O prefeito de Lucas do Rio Verde, Miguel Vaz, entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra a Lei Municipal nº 3.766/2025, que estabelece procedimentos para a distribuição e uso de produtos à base de cannabis medicinal no Sistema Único de Saúde (SUS) do município. A ação, protocolada com pedido de liminar, busca suspender imediatamente a eficácia da lei até que haja uma decisão definitiva do Tribunal de Justiça.
A lei foi aprovada pela Câmara Municipal após a derrubada do veto do prefeito, que alegava que o projeto, originado pelo Legislativo, apresentava vícios formais e materiais que comprometiam sua validade jurídica. Entre os principais argumentos da ADI, Miguel Vaz sustenta que a lei fere o princípio da separação dos Poderes ao tratar de uma matéria que seria de competência exclusiva do Executivo. Além disso, aponta que a norma foi promulgada sem estudos de impacto financeiro, o que contraria a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Constituição Federal.
Inconstitucionalidade formal e material
Na petição inicial, o prefeito argumenta que a lei municipal possui vício de iniciativa, pois foi proposta pela Câmara, quando, segundo a Constituição e entendimentos do Supremo Tribunal Federal (STF), somente o Executivo poderia legislar sobre a organização e o funcionamento do SUS. Assim, a promulgação da norma pelo Legislativo configuraria uma invasão de competência, tornando-a inconstitucional do ponto de vista formal.
Outro ponto levantado é a ausência de estudo de impacto financeiro. Segundo a administração municipal, a lei impõe ao Executivo a obrigação de fornecer medicamentos à base de cannabis sem que houvesse previsão orçamentária para isso. De acordo com o prefeito, essa situação contraria dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal e o artigo 167 da Constituição, que impede a criação de despesas sem indicação de fonte de custeio. Dessa forma, a continuidade da norma poderia comprometer as contas públicas e afetar outros serviços essenciais de saúde.
Contrariedade a entendimentos do STF
Outro argumento central da ação é que a lei municipal contraria decisões recentes do Supremo Tribunal Federal sobre o fornecimento de medicamentos não incorporados ao SUS. O prefeito cita os temas 500 e 1.234 do STF, que estabelecem critérios para que estados e municípios forneçam remédios fora da lista oficial do SUS. Entre as exigências está a necessidade de registro do medicamento na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), algo que a legislação municipal não teria levado em consideração.
Para a gestão municipal, a lei impõe obrigações que ultrapassam os critérios técnicos estabelecidos pelos órgãos federais de regulação sanitária, o que pode gerar insegurança jurídica e dificultar a implementação de uma política pública de saúde baseada em evidências científicas.
Pedido de suspensão imediata
Diante das possíveis irregularidades, o prefeito solicita ao Tribunal de Justiça que conceda uma liminar para suspender imediatamente os efeitos da lei até que haja uma decisão final. Ele argumenta que a manutenção da norma pode gerar um impacto financeiro imprevisto para o município, além de criar precedentes que comprometam o equilíbrio orçamentário.
O pedido de liminar baseia-se nos princípios do “fumus boni iuris” e do “periculum in mora”, termos jurídicos que indicam, respectivamente, a existência de fundamentos plausíveis para a ação e o risco iminente de prejuízo caso a legislação continue em vigor. Segundo a prefeitura, a implementação da distribuição de medicamentos à base de cannabis sem planejamento adequado pode comprometer a destinação de recursos para outros setores da saúde pública.
Impacto e próximos passos
A Lei nº 3.766/2025 foi recebida com expectativas por grupos que defendem o uso terapêutico da cannabis, uma vez que a medida poderia facilitar o acesso ao tratamento para pacientes que dependem desses produtos. No entanto, a judicialização da questão demonstra a complexidade do tema e levanta debates sobre os limites da atuação do Legislativo municipal, a necessidade de planejamento financeiro e a compatibilidade das normas locais com a legislação federal.
O Tribunal de Justiça ainda não se manifestou sobre o pedido de liminar. Caso a suspensão seja concedida, a lei deixará de produzir efeitos até o julgamento definitivo da ADI. Enquanto isso, o embate jurídico segue em andamento, envolvendo não apenas o Executivo e o Legislativo municipais, mas também a população que acompanha de perto as políticas públicas de saúde e bem-estar social.