De Lucas para a Europa: depois de superar adversidades, Fininho sonha estagiar agronomia na França

Wallisson Sousa planeja dar melhores condições de vida aos familiares que ainda residem em Araguaína, Tocantins, onde nasceu

Fonte: CenárioMT

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Fininho comemora uma de suas conquistas no voleibol (Foto: Arquivo Pessoal)

A trajetória de vida de Wallisson Aparecido Sousa, 24, é marcada por superações. Nascido na periferia de Araguaína, no Tocantins, desde muito pequeno sonhava conhecer o mundo e vencer, seja no esporte ou numa profissão que tem a ver com a origem da família: a agricultura.

Wallisson tem 1,98 m de altura e porte de jogador de vôlei. E foi o esporte que abriu as portas para começar a realizar sonhos. O vôlei permitiu ao jovem conhecer o país e também foi o passaporte para vir morar em Lucas do Rio Verde.

Mas, para contar a história de desafios e vitórias é necessário voltar a 1996, ano em que Wallisson nasceu. Ele foi criado pela mãe e avós com muitas dificuldades. O primeiro desafio vencido é considerado um milagre. O menino nasceu com uma síndrome rara na coluna e não sustentava a própria cabeça. Sem condições para tratamento, o futuro dele não era nada animador. Com fé, sua mãe fez uma oração que nas horas seguintes produziram uma mudança testemunhada pela família. “Graças a Deus, a Nossa Senhora de Aparecida, fui curado. Era pra ser um vegetal, estava fadado a isso. Hoje eu jogo vôlei, os médicos haviam declarado que não poderia praticar nenhum esporte. Hoje eu sou um milagre ambulante”, declarou à reportagem de CenárioMT.

Primeiro desafio

Ainda pequeno, Wallisson já mostrava seu lado obstinado. Um dia encontrou um livro que havia sido descartado no lixo. Curioso, ele pegou o material, limpou e levou pra casa, mesmo sem entender o conteúdo. Sua mãe lhe disse que era um livro de língua inglesa, gerando no menino o desejo de aprender uma nova língua, desafio que venceu com muita força de vontade. Primeiro, nos livros que encontrava e levava pra casa. Depois, quando teve acesso à internet, passou a fazer aulas online. Hoje fala 7 idiomas.

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“O primeiro foi o inglês, que comecei a estudar encontrando livros, foi difícil, desisti algumas vezes, mas tinha um sonho. Hoje falo português, inglês, francês, espanhol, italiano, alemão e holandês, ‘os filhos’ mais rebeldes, problemas, estou aprendendo ainda”, citou, afirmando que deseja estimular outras pessoas a estudarem idiomas, seja em escolas do gênero ou como conseguiu adquirir o conhecimento, por livros e internet. “É muito prazeroso”.

Conhecendo o país

Bom aluno e atleta, Wallisson ganhou destaque nos jogos de vôlei já em Araguína, que não oferecia as condições de aperfeiçoar o desempenho. Por um ano, ele morou e jogou voleibol em Umuarama, Paraná. Depois, em 2017, ganhou uma bolsa para representar Lucas do Rio Verde na modalidade. Sob a orientação da treinadora Tereza Garcia, ele participou de campanhas vitoriosas. O corpo esguio lhe rendeu um apelido que o acompanha desde que chegou a Lucas do Rio Verde: Fininho. “Sempre sonhei em jogar voleibol, viajar, conhecer cidades, pessoas”, assinalou. No início, ele levou um choque, dada as diferenças econômicas e culturais entre Lucas e Araguaína e fez questão de agradecer à oportunidade. “A professora Tereza que me trouxe pra cá, quem colocou os olhos em mim, me tirou de um local tão precário. Sou muito grato. O vôlei me trouxe aqui e abriu portas para os estudos”, disse.

Em Lucas do Rio Verde as coisas não foram fáceis. Fininho morava no alojamento do projeto, no bairro Pioneiro, e tinha que fazer os deslocamentos a pé, seja até a faculdade onde cursava Educação Física, seja no restaurante conveniado ao projeto (localizado no bairro Industrial) e até a Escola Vinicius de Moraes, onde estagiou pelo curso de educação física. Mas o jovem não desistiu. Além do estágio, ele arrumou ‘um bico’ num restaurante no bairro Parque das Emas. Graças ao aprendizado com língua inglesa e espanhola, Fininho conseguiu um emprego em uma escola de idiomas.

Como a ‘vida útil’ de um atleta profissional não é longa e Wallisson tem como meta ajudar sua família, ele decidiu ampliar o leque de opções acadêmicas para formar-se e conseguir se estabelecer profissionalmente. Optou por agronomia por ter a ver com suas origens. Além disso, a principal característica econômica de Lucas do Rio Verde é o agronegócio. “Creio que estou no celeiro, no melhor lugar do Brasil pra cursar agronomia, é o campo. O vôlei é uma paixão, gostei desde pequeno, mas eu necessito ajudar minha família”, destacou.

Convite de estágio

O desempenho em quadra e em sala de aula foi abrindo possibilidades para o jovem. Uma delas (e é a que está batalhando) foi de realizar um intercâmbio na França. Em 2018, um grupo de franceses veio a Lucas do Rio Verde e a desenvoltura de Fininho chamou a atenção da comitiva. Quando voltaram para casa, os franceses relataram à reitoria da Unilasalle francesa o comportamento do brasileiro, rendendo assim o convite para um estágio. Na ocasião, aproveitou o que aprendeu e fez conversações com os estrangeiros. Para estagiar na França, Wallisson precisaria passar por uma prova específica, de proficiência, que foi dispensada quando fez conversação online com a direção da instituição de ensino francesa. “Eles viram a fluência no idioma e não precisei fazer essa prova, me custaria algum dinheiro”, comentou.

Como cursa agronomia, e já estagiou na área em Lucas do Rio Verde, Fininho vê uma oportunidade de ouro em fazer este estágio. “Vai agregar muito, muita experiência, lá é um lugar muito forte no agro, a Europa é muito forte na agricultura”, avalia.

Em 2021, ele chegou a iniciar os procedimentos para seguir para a França, mas os planos não foram concluídos. Agora, o jovem voltou a apostar neste projeto de vida. “Estou contando com muitas pessoas que têm me ajudado. Da outra vez tive que gastar o pouco dinheiro que tinha juntado, acumulado. Era pouco. Estou acumulando um pouco de dinheiro pra fazer rifas, peço doações, fazendo vakinha online, conto apenas com as redes sociais, mas pretendo fazer uma vakinha pra conseguir fundos e viajar, pagar o seguro viagem, visto, e ter um dinheiro pra ficar lá, manter lá”, adiantou.

Apoio

“As pessoas que conheceram um pouco minha trajetória, gostaram da ideia, de poder representar Mato Grosso, Tocantins, meu Estado de origem, e o Brasil, pois serei o primeiro intercambista brasileiro a ir fazer esse estágio”, ressaltou. “Deixou de ser um sonho meu, uma coisa secreta minha, e passou a ser o sonho de muita gente, vejo as pessoas compartilhando comigo. E creio que um sonho que se sonha junto é mais fácil ser realizado, se torna possível. E as pessoas não estão apenas me ajudando, estão possibilitando a minha ida à França. Sozinho eu não consigo, conheço as minhas capacidades, e as pessoas têm dando uma força gigantesca, estratosférica, fazendo crer que eu consigo sim”, descreveu Wallisson, crendo que esta também é uma barreira que está sendo superada.