A 1ª Vara do Trabalho de Tangará da Serra, em Mato Grosso, reconheceu a ocorrência de xenofobia regional em ambiente corporativo e determinou que uma empresa indenize um eletricista em R$ 15 mil por danos morais, após ele ter sido alvo constante de piadas e comentários ofensivos relacionados à sua origem nordestina. A sentença, assinada pelo juiz Mauro Vaz Curvo, destacou a omissão patronal diante de um ambiente de trabalho hostil e discriminatório.
Segundo os autos, o trabalhador relatou ter sido diariamente constrangido por colegas e superiores, que usavam sua origem como motivo de perseguições e humilhações. Apesar de a empresa ter negado inicialmente a existência de práticas discriminatórias, um representante admitiu em audiência ter presenciado “algumas piadas” de cunho regional e confirmou que o funcionário chegou a reclamar informalmente sobre o tratamento.
Para o magistrado, o depoimento evidenciou que as manifestações xenofóbicas estavam naturalizadas no convívio laboral e não foram devidamente coibidas. “Ainda que disfarçadas de ‘brincadeiras’, as condutas relatadas são humilhantes, constrangedoras e incompatíveis com um ambiente de trabalho saudável e respeitoso”, afirmou na decisão.
Xenofobia dentro do país
O juiz ressaltou que a xenofobia não se restringe à hostilidade contra estrangeiros, mas também se manifesta dentro de um mesmo país, especialmente contra pessoas de regiões historicamente estigmatizadas, como o Nordeste. A sentença também mencionou diversos dispositivos constitucionais, convenções internacionais e leis nacionais que proíbem práticas discriminatórias, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Convenção Americana de Direitos Humanos e as convenções 111 e 190 da OIT.
Entre as normas brasileiras citadas, estão a Lei 7.716/1989, que criminaliza a xenofobia, e a Lei 9.029/1995, que proíbe práticas discriminatórias nas relações de trabalho.
A decisão enfatizou ainda que é dever do empregador zelar pela integridade física e emocional dos trabalhadores, adotando medidas efetivas para garantir um ambiente seguro, inclusivo e respeitoso.
Protocolo antidiscriminatório e repercussões
O magistrado também utilizou como base o Protocolo de Julgamento com Perspectiva Antidiscriminatória, Interseccional e Inclusiva, lançado pela Justiça do Trabalho em 2024, que orienta os juízes a considerarem desigualdades estruturais em suas decisões, como as relacionadas a gênero, raça, origem e classe social.
Além da condenação, o juiz determinou o envio de ofícios ao Ministério Público do Trabalho (MPT), ao Ministério Público Federal (MPF) e ao Ministério do Trabalho e Emprego, para que adotem providências conforme suas atribuições legais, diante da admissão de práticas discriminatórias no ambiente da empresa.
O caso reforça a necessidade de ações efetivas de combate à xenofobia regional no ambiente de trabalho e sinaliza o compromisso da Justiça do Trabalho com a proteção da dignidade e dos direitos humanos no mundo do trabalho.