Indígena de MT faz sucesso na web após ‘desafio dos 10 anos’ com foto na aldeia e no trabalho

Fonte: G1 MT

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Foto: Arquivo Pessoal

O indígena Dyakalo Foratu Matipu postou uma foto do “desafio dos 10 anos”, brincadeira que viralizou nas redes sociais, e a montagem com uma foto de 2009 e uma outra de 2019 teve repercussão. Farato, como gosta de ser chamado, é da etnia Matipu, nasceu na Aldeia Kuikuro e cresceu na Aldeia Buritizal, ambas localizadas na região do Alto Xingu, em Mato Grosso.

Farato, como é conhecido, disse que não esperava que o post tivesse mais de 2 mil compartilhamentos e ganhasse repercussão em tão pouco tempo.

Ele postou uma foto de quando ainda vivia na aldeia e outra, 10 anos depois, dele trabalhando como técnico de enfermagem.

No final de 2018, Farato passou em primeiro lugar em ciências da matemática na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), em Canarana, a 838 km de Cuiabá, onde mora atualmente.

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Farato contou que sempre sofreu preconceito por ser indígena, mas que nunca desistiu. Começou a estudar aos 10 anos. Até então, vivia na aldeia, pescando e jogando futebol com as outras crianças do local, sem a oportunidade de ser alfabetizado.

“Entrei direto na escola, porque já tinha 10 anos. Meu sonho era aprender a ler e a escrever. Isso era um grande desafio para mim. Eu entrei sem conhecer nenhuma letra”, disse.

Conforme Farato, o preconceito vem, tanto de estranhos quanto dos próprios índios.

“Há um preconceito muito forte na escola, no trabalho e até na rua. Sofri preconceito por parte de professores, de colegas, mas sempre fiquei de cabeça erguida, porque nunca deixei ninguém me rebaixar. Meu próprio povo, ao me ver trabalhando de servente de pedreiro, com a roupa toda suja, me chamava de doutor, porque sabia do meu sonho, mas ria de mim”, desabafa.

Quando começou a aprender ler, precisou sair da escola, pois a família se mudou de aldeia.

“Nessa outra aldeia, eles não ensinavam português. Apenas a nossa ‘língua-mãe’. Então, foi muito difícil conseguir”, lembrou.

Farato pegava jornais e revistas que, muitas vezes, estavam jogados na aldeia e tentava ler. “Fui aprendendo sozinho. Palavras mais difíceis, como mosquito, por exemplo, eu não conseguia ler”, conta.

Certa vez, ganhou um dicionário.

“Meu sonho era falar português e ser ‘alguém na vida’, porque meu pai e minha mãe eram analfabetos. Então pedi um dicionário para meus primos, de outra aldeia. Comecei a aprender outras palavras. Lia desde a primeira página até a última. Gostava de ler, mas não sabia interpretar”, explicou.

Paixão pela saúde

Aos 13 anos, descobriu a paixão pela área da saúde, com o trabalho dos monitores de saúde indígenas, que andavam de casa em casa para verificar a saúde dos índios.

“Eu me perguntava se poderia ser igual a eles. Sempre ia na casa desse monitor, até que ele me chamou para acompanhá-lo. Eu ficava responsável por gotejar os remédios, verificar a temperatura e eu gostava muito”, disse.

Em 1997, participou de um treinamento para se tornar agente indígena de saúde, no posto Orlando Villas Bôas.

Era o mais novo dos profissionais de saúde. Compartilhou com os pais que queria ser monitor de saúde. Algumas pessoas diziam que não conseguiria.

“Meu pai tinha comprado um caderno, peguei minha bicicleta e fui na casa do monitor de saúde da aldeia. Perguntei para ele se ele podia me ensinar a descobrir quando uma pessoa estivesse doente. Então nós fomos a um postinho de saúde. Ele pegou um termômetro e colocou na axila dele e me ensinou a utilizar”, afirmou.

O curso teve início. Ele passou por dificuldades financeiras durante esse período.

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“Era 2006. Não comia nada, porque não tinha condições de comprar. Éramos 54 agentes indígenas de saúde. Demoramos dois anos e meio para concluir o curso e formamos em 2009. Essa foi minha primeira vitória”, contou.