Comunidades ciganas de MT tentam manter tradições e geração jovem ainda enfrenta preconceito

Fonte: Denise Soares, G1 MT

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Foto: Karen Ferreira

Presentes em Mato Grosso desde a década de 60, as comunidades ciganas tentam manter as tradições nos dias atuais, mas a geração jovem ainda enfrenta preconceito no estado.

O último levantamento da Associação Estadual das Etnias Ciganas de Mato Grosso (AEEC-MT) apontou que em Mato Grosso existem 130 famílias ciganas (cerca de 300 pessoas), espalhadas por Rondonópolis, Cuiabá e Tangará da Serra.

A presidente da associação, Fernanda Alves Caiado, de 34 anos, recorda as histórias dos avós, que andavam em tropas a cavalo, dormiam em barracas e vendiam mercadorias de cidade em cidade, até viajarem de Minas Gerais a Mato Grosso.

“Meu avô era goiano e andava em tropas. Conheceu minha avó em Minas Gerais, que não era cigana. Eles faziam negociações de produtos e animais”, contou.

Segundo ela, os ciganos possuem algumas características marcantes: gostam de se reunir em família, são unidos e têm o dom da negociação. Não é à toa que a maior parte dessa etnia trabalha como comerciante, inclusive a própria Fernanda.

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O casamento entre primos também é algo comum na comunidade cigana. Com a pandemia, as grandes reuniões em família foram suspensas para evitar aglomerações. Grande parte dos ciganos em Mato Grosso tem residência fixa.

“A principal característica dos ciganos é a união. Temos a necessidade de estarmos perto um do outro e nessa pandemia temos sofrido muito. Outra coisa que mantemos na nossa cultura é a negociação. A gente vive de negociar, às vezes sem perceber, mas temos o dom de negociar”, disse a presidente.

 

A figura de maior destaque da cultura cigana em Mato Grosso é Maria Divina Cabral, ou Diva como é mais conhecida, que foi recentemente referenciada como mestre da cultura mato-grossense.

Diva nasceu na cidade de Mineiros (GO) e viveu boa parte de sua vida nos lombos dos cavalos, trafegando por várias cidades da região Centro-oeste.

No início da década de 70 fixou residência com sua família e parte da comunidade em Rondonópolis, a 218 km de Cuiabá, que se tornou a maior comunidade cigana de Mato Grosso.

A cigana rezadeira é respeitada e ouvida por todos devido à sua experiência e sabedoria na condução e guardiã de diversos costumes, narrativas e saberes da filosofia kalon, nome do grupo que ela pertence.

“Diva vive da garrafada, da raizada e xaropes. É uma cultura que ela passou para as filhas e elas tentam passar para as netas”, comentou a presidente.

 

Conhecedora de uma variedade de plantas medicinais do cerrado e da floresta amazônica, Diva usa os saberes da medicina tradicional Calon para atender também aos não-ciganos.

“A terceira geração sabe menos da cultura cigana porque existe, infelizmente, um certo preconceito da sociedade com os ciganos. As pessoas têm uma visão de que somos ladrões e mentirosos. Então, às vezes, temos pessoas mais jovens na família que nem citam que são ciganos por medo de serem tratado mal ou por vergonha”, lamentou Caiado.

 

A presidente lembrou que no ano passado um primo dela morreu com Covid-19. Em postagens nas redes sociais, a família do paciente recebeu uma enxurrada de críticas pelo fato do rapaz ser cigano.

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“A nova geração tem que se orgulhar e não se envergonhar. Quando escuto as histórias dos meus avós e vejo o quanto eles sofreram e foram perseguidos, hoje vejo os ciganos que podem viver, estudar e eu posso falar que sou cigana”, disse.

A presidente diz que ainda existem ciganos nômades no país e em Mato Grosso, no entanto, a falta de documentação deles dificulta a associação a ter um levantamento específico desses povos.

O Dia Nacional dos Ciganos é comemorado no dia 24 de maio. A data foi escolhida em homenagem à Santa Sara Kali, padroeira de muitos grupos romani, especialmente do continente europeu.

Redatora do portal CenárioMT, escreve diariamente as principais notícias que movimentam o cotidiano das cidades de Mato Grosso.