Dops caminha para tombamento após 10 anos de espera no Rio de Janeiro

Após mais de uma década de trâmites, o antigo prédio do Dops, símbolo da repressão política, pode finalmente ser tombado pelo Iphan ainda este mês.

Fonte: CenárioMT

Dops caminha para tombamento após 10 anos de espera no Rio de Janeiro
Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

O edifício que abrigou o antigo Departamento de Ordem Política e Social (Dops), no centro do Rio de Janeiro, está prestes a receber o tombamento definitivo pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). A decisão será tomada no dia 26 deste mês, durante reunião do Conselho Consultivo do órgão. O processo, que se arrasta há mais de dez anos, reconhece o valor histórico e arquitetônico do prédio, palco de graves violações de direitos humanos durante a repressão política no século passado.

De acordo com o Iphan, o tombamento se justifica pela importância simbólica do imóvel nas lutas pela democracia e liberdade. A medida atende a pedidos da sociedade civil e do Ministério Público Federal (MPF), que há décadas defendem a criação de um centro de memória dedicado às vítimas da violência de Estado.

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Construído em 1910, com inspiração francesa, o edifício foi originalmente sede da Polícia Federal. Desde a década de 1960, está sob responsabilidade da Polícia Civil do Rio de Janeiro, que o utilizava para fins policiais. O prédio encontra-se fechado há mais de dez anos e em estado de conservação precário desde 2014, quando foi vistoriado pela Comissão Estadual da Verdade.

Até o início dos anos 2000, funcionou no local um embrião de Museu da Polícia Civil, desativado posteriormente. O espaço também abrigou a Coleção Nosso Sagrado, formada por mais de 500 objetos de religiões de matriz africana apreendidos entre 1889 e 1964, atualmente sob a guarda do Museu da República e de lideranças religiosas.

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Em 2024, o Coletivo RJ Memória, Verdade, Justiça e Reparação participou de uma vistoria com o MPF e encontrou o prédio deteriorado, mas ainda com elementos originais da época da repressão: armários com inscrições do Dops, celas, salas de interrogatório e o antigo gabinete do chefe policial Filinto Müller. Segundo o arquiteto e pesquisador Felipe Nin, o local mantém “todos os elementos autênticos de quando funcionava como uma repartição da repressão”.

O coletivo denunciou o abandono do imóvel e questionou o projeto da Polícia Civil de transformá-lo em um centro cultural, que, segundo Nin, ignora o passado do Dops e propõe até transformar antigas celas femininas em um bistrô. Ele classifica a proposta como “um projeto de apagamento histórico”.

Com o tombamento, o imóvel não poderá ser descaracterizado. As carceragens femininas, com inscrições das décadas de 1950 a 1980, deverão ser preservadas. O prédio recebeu opositores políticos como Olga Benário, Nise da Silveira, Abdias Nascimento e Luís Carlos Prestes, que sofreram perseguição e tortura no local.

Felipe Nin, sobrinho de Raul Amaro Nin — preso e morto sob tortura em 1971 —, defende que o tombamento garante a proteção do imóvel e da memória das vítimas. “Esse prédio representa um passado que o Estado brasileiro tentou apagar. É fundamental preservá-lo para que essas atrocidades não se repitam”, afirmou.

Ex-presa política, a farmacêutica Ana Bursztyn Miranda também defende a criação de um espaço de memória no antigo Dops. Para ela, lembrar o passado é essencial para combater a violência de Estado ainda presente nos dias atuais.

Em nota, a Polícia Civil confirmou o interesse em manter o imóvel e instalar um centro cultural, mas não divulgou detalhes sobre o projeto.

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Gustavo Praiado é jornalista com foco em notícias de agricultura. Com uma sólida formação acadêmica e vasta experiência no setor, Gustavo se destaca na cobertura de temas relacionados ao agronegócio, desde insumos até tendências e desafios do setor. Atualmente, ele contribui com análises e reportagens detalhadas sobre o mercado agrícola, oferecendo informações relevantes para produtores, investidores e demais profissionais da área.