O Covid-19 não é o problema, talvez isto seja

Fonte: Fernando Alves 

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E se eu te falar que o problema talvez não seja o Covid-19?

 Estamos em pandemia! O Covid-19 é o assunto do momento.

E se ele fosse um meteoro, cruzando o nosso céu, veríamos em seu rastro a imagem de uma extensa destruição, seja ela de vidas, de famílias, seja pelo declínio de postos de trabalho, da economia, entre outros.

Mas brasileiro que é brasileiro, também sabe extrair cenas engraçadas, mesmo em tempos tenebrosos, a exemplo do outdoor dos ‘dançarinos de caixão’, ou do trocadilho, de que ‘hoje, se você não pode convidar mais que 20 pessoas, então covid-19’, dentre milhares de outras brincadeiras que nos fazem rir em meio a tanta catástrofe.

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Sabe-se que para conter a propagação do vírus, o isolamento social é o mais indicado.  Claro, acompanhado de tantas outras medidas, já exaustivamente divulgadas. E contrariar tal recomendação pode ter consequências devastadoras. Vejam só quantas covas estão sendo abertas – e fechadas – em alguns países.

Mas o isolamento social causa uma reação diametralmente oposta. Vem de Isaac Newton que, para toda ação, existe uma reação, de mesma intensidade (!?), em sentido contrário.

A reação, oposta ao isolamento social, é a crise econômica.

Quantas lojas, mercearias, padarias, cinemas, shoppings, estacionamentos, barraquinhas de cachorro quente, de pastel com catupiri, restaurantes de comida tradicional acreana, enfim, estão sofrendo com a crise econômica e lutando – do jeito que dá, e quando dá – para não falirem!

Sofre empresário, sofre colaborador, sofre ambulante, sofre microempreendedor individual. Sofre eu, sofre você, sofre nós e todos do verbo to be.

Com o dinheiro circulando menos, não será mais o despertador do celular que acordará o trabalhador, será a noite mal dormida, em razão da preocupação de pagar as contas que estão vencendo.  E chegamos a um ponto interessante, caríssimo leitor (a), que é  quando a carteira fica vazia, o limite do cartão fica apertado e o talão de cheque já não tem tantas folhas assim. Aí meu, amigo, minha amiga, não tem direita e nem esquerda, não tem ideologia política que salva quem está se afogando. Já não se sabe, na luta entre o bem e o mal, quem é um e quem é outro.

Abre tudo, fecha tudo, com lockdown, sem lockdown.

Vai matar o brasileiro de fome, sem dinheiro e trabalho, ou vai matar o brasileiro pela falta de vagas na UTI?

Em dois cenários: a grande mídia milita pelo isolamento, e o atual presidente, que participa de manifestação, bem, ele não é tão pró-isolamento assim.

E em meio a essa bagunça, quem está certo, sinceramente, eu não sei. Aliás, não acredito haver certo ou errado em um cenário tão novo. Mas sei que a aposta em um dos lados acompanha a responsabilidade sobre os efeitos que virão.

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Nossos dias se consomem, os números continuam crescendo e vivemos esperando dias melhores? Sim! Mas também tentamos permanecer vivos para ver o pico dessa tal pandemia. E, conforme o cenário muda, a previsão também se estende. Parece a previsão do tempo, quando diz 15% de possibilidades de cair uma tempestade com rajadas de vento, granizo e descargas elétricas isoladas.  Usando jargões da Bolsa de Valores, difícil adivinhar o fundo de alguma coisa, quando existe a possibilidade de, atingindo o chão, haver ainda um porão…

Assim, dados são usados para o bem ou para o mal, para dizer que o fim da pandemia está próximo ou não.  Certo é que o número de mortos e infectados cresce, assim como o número de curas. Em rápida pesquisa, encontrei o nº de 38.654 de infectados, 14.026 recuperados (36% dos infectados se recuperaram) e 2.462 de mortos (6% faleceram).

Em Mato Grosso o número de casos confirmados está em 174, 79 recuperados (45% dos infectados se recuperaram), 11 hospitalizados (6% do total de infectados) e 5 faleceram (2% do total). Estamos falando de um estado cuja população aproximada seja de 3,2 milhões de pessoas.

Diante dessa informação é possível especular que o número de casos é muito baixo diante da população, sendo possível militar em favor da reabertura do comércio. Todavia, é possível, também, militar a favor do isolamento social, tendo em vista que vivemos uma realidade gritante de subnotificações, tendo em vista que muitos casos são assintomáticos, e é melhor prevenir do que remediar (temos exemplos em vários países que escolheram ‘remediar’, não é mesmo?).

Pois bem.

Se eu não vou militar a favor deste ou daquele posicionamento (apesar de ter um, é claro), do que falarei?

Simples, o problema nunca foi (é bem chocante o que irei dizer, por isso já estou fazendo esta pausa dramática) o Covid-19!

Parece até heresia. Chamem o tribunal de inquisição!

Calma lá parceiro, deixa eu me explicar.

Quando a pandemia dava as suas caras por aqui, em terra de verdes mares e canários, o primeiro produto a sumir das prateleiras foi o “alquingel”, e quando voltou a aparecer, o preço era estratosférico. O mesmo “alcoonteceu” com as máscaras, que sumiram e/ou se tornaram caras.

Para além disso, o que quero realmente dizer é que existe uma mentalidade de sobrevivência pairando na nossa sociedade.

Senão vejamos:

Por que as pessoas querem que o comércio seja reaberto? Ganhar dinheiro e …

Por que as pessoas querem que o isolamento social continue? Não contrair o Covid-19 e …

Por que foi preciso limitar as compras de “alquingel”? Continuar …

Por que se tornou difícil comprar máscaras que antes custavam algumas poucas moedas? Se proteger para …

Por que algumas pessoas pensam em estocar alimentos? Para …

Sim. SOBREVIVER. Simplesmente.

Com efeito, necessário se faz aventar outra questão que ninguém comenta. Existe uma maneira de dar tranquilidade para o maior número de pessoas possíveis? Seja de direita, esquerda, a favor ou contra o isolamento e/ou abertura do comércio?

Sim, existe uma questão para além de tudo isso, até mesmo do coronavírus.

Trata-se de melhorar a distribuição de renda, de diminuir o abismo que existe, no nosso Brasil, entre os extremos, buscando corrigir as inúmeras distorções existentes.

Antes de alguém vir me chamar de esquerdista, comunista e etcétera, cumpre salientar que existem países desenvolvidos nos quais a distribuição de renda é extremamente melhor do que a nossa, sem um abismo no meio, e, mesmo em tempos de crise, ricos permanecem ricos, ou até aumentam a sua conta bancária, e pobres permanecem como estão.

Melhor dizendo. Se o preço de um alimento sobe, quem tem mais dificuldades de comprar? Se os medicamentos ficam mais caros, quem não vai conseguir adquirir? Se tem poucos empregos, quem conseguirá se manter por mais tempo?

Vamos para os números.  Segundo o portal El País, mais pobres podem levar até 9 gerações para alcançar a renda média.

Renda média! Média! Mediana! Nove!

Assim, uma pessoa precisa de nove gerações para ter uma qualidade de vida razoável, mas aí eu lanço outra pergunta: quantas gerações ela precisa para morrer de fome, por falta de saúde de qualidade, pela violência, enfim, por tantas causas? Isso aí, meu companheiro de leitura, precisa bem menos de uma geração.

Basta estar vivo para morrer, mas não basta estar vivo para ter uma boa qualidade de vida.

A título de curiosidade, se levarmos em consideração que uma geração dure 25 anos, 9 gerações são 225 anos, ou seja, para a pessoa ter nascido pobre e alcançado a renda média neste ano de 2020, precisaria ela ter nascida em 1795. Pense comigo nas pandemias, doenças, riscos dos mais diversos que ocorreram nesse tempo e que esta mesma pessoa teria que sobreviver. Lembrando que a gripe espanhola aconteceu em meados de 1918.

O que quero dizer é, com uma melhor distribuição de renda, quantas mortes poderiam ter sido evitadas? Teríamos mais ou menos coronavírus? E todo esse desespero que vemos, para os dois lados, não passa do desejo de sobreviver em tempos de crise.

Todavia, alguns vivem isolados dentro da sua casinha com piscina (de boa na lagoa) com a bandeira do isolamento social na mão, e outros querem que o isolamento social seja flexibilizado/terminado para não quebrarem /afundarem ainda mais/morrerem.

O resultado disso tudo é culpa do corona ou da péssima distribuição de renda? Quantas mortes temos por falta de leitos de UTI, por fome, por doenças, que existem e continuarão a existir?

E se vierem noites traiçoeiras de outro vírus e nada mudar, a culpa será do vírus novo ou do nosso velho individualismo que, quando a situação aperta, certamente a corda arrebenta para qual lado (leia-se, do lado dos pobres)?

 
Fernando é acadêmico de Direito, pendente ao Direito Penal e ávido leitor das notícias regionais. Técnico em eletrônica por formação, todavia, é fascinado por escrever, seja qual for o assunto.