Corte de R$ 34 mi: estudantes da UFMT divergem sobre bloqueio no orçamento

Fonte: OLHAR DIRETO

reitoria da ufmt
(Foto: Mateus Hidalgo)

O corte orçamentário de 3,5% no ensino superior anunciado pelo Governo Federal divide opiniões. Alguns estudantes da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) são totalmente contra a redução e afirmam que a educação precisa de mais investimentos. Outros se demostram a favoráveis e alegam que o bloqueio teria sido a porcentagem não declarada pelas universidades federais. A alegação, entretanto, não corresponde à realidade, de acordo com as agências de checagem de notícias. O valor equivale a R$ 34 milhões no orçamento da UFMT.

Caso a medida proposta pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) não seja revista em até 60 dias, a UFMT pode deixar de honrar contratos de água e luz. Como consequência, o Restaurante Universitário pode deixar de atender. A partir de agosto deste ano o valor da refeição sairá de R$ 2,00 para R$ 2,50 para os estudantes que não se encontram em situação de vulnerabilidade social. Os que se enquadram continuarão se alimentando sem custo algum.

A reportagem esteve no Campus para ouvir a opinião dos estudantes. Muitos alunos se recusaram a falar e alegavam que “não queriam arrumar confusão”. Outros, entretanto, aceitaram, desde que não fossem identificados. Apenas dois quiseram expor seus nomes.

Estudante do curso de Geografia, Lucas Vinicius estava no RU com algumas amigas e lamentou a atualização do valor que deve ocorrer nos próximos meses, por conta do corte no orçamento. Segundo ele, com o primeiro aumento que ocorreu no início do ano, de R$1 para R$2, ele já encontra dificuldades para se alimentar. A opção mais econômica, por enquanto, é ir até a sua residência para almoçar.

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Na oportunidade, ele indicava para a amiga, Keloirine Kevia, 16 anos, alguns restaurantes com valores acessíveis na região. A estudante de Psicologia, que mora na região do CPA, disse que não tem como se deslocar até sua casa, por conta da distância. Ela leva cerca de uma hora para chegar à UFMT. Ela relatou que não teve uma boa experiência com o RU. “Eu me senti muito cheia, estufando minha barriga. Eu comi pouco, mas a sensação de cheia passou muito rápido. Eu fiquei com fome depois. Estou procurando outros lugares pra comer, que não seja aqui e também seja barato”, contou.

Sobre os R$ 34 milhões cortados do orçamento da UFMT, uma estudante do curso de Enfermagem, que preferiu não se identificar, se posicionou contra e o considerou desnecessário. “De certa forma é desnecessário, porque existem outros gastos que poderiam ser cortados. A educação do País, a gente sabe que é algo muito precário e precisa de investimento, e não cortes. Isso está afetando a todos. É muito importante que independente da posição politica das pessoas, a gente se una neste momento para tentar fazer a diferença e que essa opinião dos cortes seja revertida”.

Já um estudante do curso de Arquitetura e Urbanismo se declarou a favor do bloqueio orçamentário. “Sinceramente eu acho que o corte é ate certo. Porque os 30% que foram cortados foi um dinheiro não declarado, que não foi dito para o Governo para o que estava sendo usado na UFMT”, alegou.

Ao anunciar a medida, o MEC explicou, em nota, que os cortes fazem parte de uma “restrição orçamentária imposta a toda a Administração Pública Federal por meio do Decreto n° 9.741, de 28 de março de 2019”. E que “o bloqueio decorre da necessidade de o governo federal se adequar ao disposto na Lei de Responsabilidade Fiscal, meta de resultado primário e teto de gastos.” Não menciona, portanto, qualquer desvio de verbas cometido pelas instituições.

Pós-graduação

A Universidade adotou uma série de medidas emergências. Com isso, a pós-graduação também sofre o impacto no corte das bolsas, o que fragiliza os 66 programas existentes. “A médio prazo, isso impede a formação de profissionais de ponta para a região e, a longo prazo, compromete todo o desenvolvimento científico, econômico e social”, afirma a pró-reitora de Ensino de Pós-Graduação, professora Ozerina Victor de Oliveira.

A UFMT possui mais de 680 projetos de extensão atuando diretamente nas comunidades em que se insere e esse número chegaria a mil até o final do ano. No entanto, o bloqueio pode inviabilizar a continuação desses projetos. Para o professor Fernando Tadeu de Miranda Borges, pró-reitor de Cultura, Extensão e Vivência, “se a universidade paralisa, todos esses programas e projetos vão deixar de ser atendidos. São muitas atividades ligadas à cultura, à saúde, ao conhecimento que impactam diretamente na população”.

Formada em comunicação social pela UFMT, uma aluna de mestrado em antropologia social acredita que os cortes nas despesas discricionárias são um soco no estômago da pós-graduação, pois atingem diretamente a pesquisa.

“Uma universidade só é universidade quando, além do ensino, promove pesquisa e extensão, caso contrário, é somente faculdade. Eu tenho certeza que todas as pesquisas trazem resultados tanto práticos para a sociedade, quanto para o próprio aluno, e, por mais que a população em geral acredite que isso não tem importância, esta é somente mais uma forma de cegá-los, de jogar a importância para outro lado e, depois, ir aos poucos sucateando tudo – até mesmo o ensino básico, que estes defensores do fim da universidade pública parecem usar como bode expiatório. Quem pesquisa, por exemplo, os métodos de ensino eficazes para a educação básica? Não é a universidade?”, questiona.

“Vamos ficar para sempre reféns de pesquisas estrangeiras, que são feitas em uma realidade alheia à nossa? A ciência no Brasil ficou por muitos anos condicionada a um ‘resto’ da ciência europeia, e quando, de uns anos para cá, conseguiu começar a se erguer, vem esta lavada. Eu fui uma das alunas que fez intercâmbio pelo Ciência sem Fronteiras, um investimento imenso que foi feito em pesquisa e nos pesquisadores, e que, como pudemos ver, não trouxe grandes prejuízos aos cofres – o prejuízo veio, sim, mas de outro lugar, e de erros da presidenta. É triste ver uma mudança tão drástica de prioridades, em tão pouco tempo”, lamenta.

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Bloqueio total foi de 3,4%

O Ministério da Educação esclareceu que o bloqueio preventivo realizado nos últimos dias atingiu apenas 3,4% do orçamento total das universidades federais. O orçamento para 2019 dessas instituições totaliza R$ 49,6 bilhões, dos quais 85,34% (R$ 42,3 bilhões) são despesas de pessoal (pagamento de salários para professores e demais servidores, bem como benefícios para inativos e pensionistas), 13,83% (R$ 6,9 bilhões) são despesas discricionárias e 0,83% (R$ 0,4 bilhão) são despesas para cumprimento de emendas parlamentares impositivas.

Por meio de nota, o MEC informou que o bloqueio orçamentário nas universidades não incluiu as despesas para pagamento de salários de professores, outros servidores, inativos e pensionistas, benefícios, assistência estudantil, emendas parlamentares impositivas e receitas próprias.

A reitora da UFMT, Myrian Serra, em recente entrevista, disse que a redução não foi homogênea em todos os setores. Para as áreas de manutenção e funcionamento da Universidade, por exemplo, o corte foi de 38%. Já sobre a verba destinada ao Ensino à Distância, o corte chega a 70%. Atualmente, 97% do orçamento do campus é comprometido com o pagamento de funcionários.